terça-feira, 10 de novembro de 2009

Artigo: Overground carioca



Por Creso de Franco Peixoto

Ao se perguntar para paulistanos e cariocas sobre o maior problema de transporte, ouve-se, certamente, sobre a dificuldade para chegar ao trabalho e voltar para casa. Não há avenidas alternativas. Como atender ao apelo do governo para ir de Metrô ou ônibus? Parece que não existe Metrô, em função de sua reduzida extensão. Ônibus? Lentos. Dá até para memorizar números das casas ou para guardar imagens da cidade, para termos no que pensar quando formos demitidos, porque não conseguimos chegar no horário. E não faltam belezas para apreciar nas duas metrópoles. Mas não em troca do transporte eficiente.

Há solução. Metrô, com extensão suficiente para atender toda a cidade, alimentado por ônibus, bicicletas, carros ou até por passageiros a pé. Duzentos quilômetros de Metrô. Esta é a mágica extensão que liberta cidades do caos rodoviário. Cidades que disponibilizam desta extensão não precisam ameaçar frágeis motoristas com talões de multa ou infindáveis ruas proibidas para o estacionamento. Eles vão querer deixar seus carros em casa.

Mas, quando e como obter recursos para sua construção? Não há momento mais oportuno para o engrandecimento dos dois Metrôs, para resolver de vez os problemas de transporte de massa de suas urbes. Metrôs são órgãos vitais dos corpos destas metrópoles. E o momento? Agora! Copa e Olimpíada. Vultosas quantias devem ser alocadas paras atender às imposições de mobilidade urbanas e regionais, tanto para atletas, dirigentes e espectadores. Contudo, encerrada a festa, passageiros comuns irão substituí-los. São estes que vão justificar mesmo os recursos de elevada monta.

Caso faltem recursos para que os metrôs carioca e paulistano atinjam a mágica extensão, há alternativa. O dinheiro do Trem de Alta Velocidade (TAV) a interligar Rio e São Paulo. De custo estimado superior a US$ 10 bilhões, permitiria construir mais de 100 km de Metrô subterrâneo. Então, que se construam túneis e elevados nas duas metrópoles, com igual divisão de recursos. Metrô elevado custa menos que metade do que em túnel. Desta forma, poderiam ser construídos 25 km de túneis e 50 km em elevado em cada metrópole, modelo do underground e overground londrinos, anglicismos de metrôs subterrâneo e elevado, cuja licenciosidade lingüística se subentenda como marketing, na tentativa de estabelecer fato novo.




No Rio, um overground carioca poderia ser construído utilizando suas singularidades. Bairros cujas fronteiras modeladas por matas, morros e orla poderiam apresentar viadutos metroviários a gerar espetáculo futurista, devidamente hierarquizado para que se não ofusquem monumentos e belezas naturais. Seria a retomada da fase vanguardista que aproximou os extremos da cidade, com viadutos que se tornaram fundamentais para a vida carioca. Nesta proposta, circulariam trens entre cidade e morros. Baixo ruído para não despertar a fera da agressão ao meio ambiente. Beleza, a se incorporar ao seu dia-a-dia. Segurança? Aparatos de proteção sejam instalados, onde necessário.

E o carioca gosta de ver sua cidade e de senti-la. Basta citar que, poucos anos atrás, havia certa reprovação à ideia da instalação de pontes de embarque no Aeroporto Santos Dumont. Opinião de cariocas que gostavam de sair do avião e cruzar o pátio. Sentir odores marinhos e reverenciar, ainda que discretamente, aqueles braços abertos sobre o Corcovado.

Então, que se façam, sob máxima prioridade, as linhas subterrâneas, para Niterói, e para as áreas ainda sufocadas por falta de mobilidade, quer sejam em túneis, elevados ou até em superfície. Um overground carioca, bálsamo para a urbanopatia do congestionamento, construído sobre falésias repletas de frágeis imóveis, indenizáveis com casas em áreas seguras. Resgata a cidade maravilhosa em mundo de rodoviarismo desenfreado. Saneia a atmosfera que evoca o lúdico de suas festas e a descontração de seus habitantes.

É viável a proposta? O TAV tem perspectiva de atender 30 milhões de passageiros no ano de 2014. Os dois metrôs aumentariam a capacidade em mais de um milhão de passageiros por dia em cada sistema. Seriam 730 milhões de passageiros por ano. Vinte vezes mais passageiros do que no TAV. Viável, sob ótica econômica. E mais, o TAV atende às classes média e alta, principalmente. Metrô, a todos. Viável, sob ótica social. Faça-se a pergunta correta: você quer chegar mais rápido em casa todo dia ou viajar mais rápido quando precisar ir para a metrópole vizinha? E se a resposta ainda for para a eventual viagem mais longa, ainda tem a opção por avião e em passagem promocional. Mais barata do que no belo trem. E ainda continuará a sentir a emoção quando o avião se prepara para pousar na meca das belezas naturais, Rio. Queremos o TAV, mas depois de resolvidos os problemas de transporte urbano.


Creso de Franco Peixoto (Engenheiro civil, mestre em Transportes e professor do Curso de Engenharia Civil do Centro Universitário da FEI - Fundação Educacional Inaciana).

Um comentário:

  1. Em engenharia aprendemos que os recursos devem ser investidos nos momentos certos de forma que otimizemos critérios. Diante da atual, caótica, situação rodoviária de nossas metrópoles, a qual vem afetando uma grande gama de brasileiros, não nada mais lógico do que realocar os gastos com o TAV em linhas de metrô. A questão está em resolvermos o que é mais urgente. O que estamos considerando mais urgente?

    Flavio Caffarello
    Graduando em Engenharia Civil

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