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Por *Stephan Keese
Criou-se o mito que o
brasileiro é naturalmente apaixonado por carro. De fato, temos no carro nosso
principal meio de transporte, somos um dos maiores mercados produtores e
consumidores e temos tradição no automobilismo. Vários argumentos suportam essa
tese. E, como apaixonados por carro, os brasileiros devem (ou deveriam) se
preocupar mais com a manutenção e durabilidade de seus veículos. E é aí que o
processo de pós-vendas oferecido pelas montadoras deveria cativar seus
clientes. A oferta de serviços, garantias e revisões é fundamental para que o
consumidor continue feliz e satisfeito com seu automóvel e aumente a fidelidade
à marca.
Nessa linha de raciocínio, as
montadoras vêm desenvolvendo, embora lentamente, ações de melhoria no seu
pós-vendas. Garantias que eram parciais e de um ano agora são totais e duram
dois anos para a maioria dos veículos. Peças que possuíam preços exorbitantes e
que variavam entre concessionárias agora têm valores tabelados. Revisões que
não eram padronizadas agora possuem pacote básico de itens e preço fixo dos
serviços básicos. Cuidar do carro está muito mais fácil, prático e ligeiramente
mais barato.
Nem tudo são flores, porém.
Grande parte das montadoras ainda não aderiu essa onda de padronização. E
alguns dos programas anunciados não são cumpridos totalmente. O pacote básico
de manutenção pode não incluir altos valores de mão de obra. A garantia de
cinco anos pode não cobrir as principais peças. Sem contar a famosa
"empurroterapia", ainda praticada pelas concessionárias. O primeiro
passo foi dado, mas há um longo caminho a trilhar. E o consumidor, que está
cada vez mais informado, não perdoa. Ou mantém a relação com a montadora apenas
até o fim da garantia e somente para serviços básicos, ou já assume desde a
compra que a manutenção será feita pelo mecânico de confiança da família ou por
uma das redes independentes de serviços automotivos que continuam em plena
expansão nos grandes centros urbanos.
A receita para reverter a
desconfiança do consumidor passa por vários fatores: Primeiramente, os processos internos devem
ser revistos para melhor atender as demandas do consumidor. Controle de estoque
de peças, renovação do layout da oficina, agendamento online de revisões e
controle do tempo de serviço (existem revisões feitas em menos de 4 horas)
fazem parte das atividades que colaboram para que o serviço fique cada vez mais
padronizado, profissional e eficiente (mais barato para a montadora e para o
consumidor). Qualificação técnica também é necessária. Com a evolução
tecnológica dos automóveis, o mecânico da esquina terá cada vez mais
dificuldade para executar serviços de manutenção em carros modernos e, da mesma
maneira, o mercado terá cada vez menos profissionais qualificados para
trabalhar em oficinas. A montadora que tiver a melhor equipe passará mais
segurança e qualidade ao consumidor.
Por último, não há como
crescer o pós-vendas sem investimentos. Ampliar o número de estações de
trabalho vem sendo um ritual executado pelas concessionárias, que precisam
estar aptas a atender um crescente número de clientes, consequência da explosão
de vendas de carros novos que o Brasil experimentou nos últimos anos. Esse
investimento não é barato. Oficinas de concessionárias chegam a demandar
investimentos de alguns milhões de reais, sem contar estações de trabalho
especiais para carros importados com tecnologia ainda mais sofisticada.
As concessionárias ainda
pecam em não aproveitar o potencial de rentabilidade do pós-vendas. Com a queda
dos resultados financeiros em vendas, decorrente do aumento da competição e da
guerra de preços, ter um pós-vendas lucrativo pode salvar a continuidade dos
negócios de um distribuidor. Lembrando que lucratividade não quer dizer
necessariamente maiores preços, e sim mais eficiência e qualidade no
atendimento, aliados ao aumento do volume de serviços.
Lições do exterior não
faltam. Programas de fidelidade à marca são comuns e costumam fazer o cliente
fiel. Atendimento diferenciado,
descontos em peças e acessórios, programas de revisão premium, extensão de
garantia e desconto na futura troca de carro são artifícios que podem colaborar
a trazer o cliente para dentro da concessionária não apenas na hora da compra.
Cuidar do carro é um prazer
que o brasileiro tem e que deve ser tratado com muita atenção. A montadora que
tiver sucesso poderá fazer com que sua área de pós-vendas seja a futura galinha
dos ovos de ouro, prendendo o consumidor à marca e compensando a rentabilidade
perdida na venda com bons resultados tipicamente obtidos com serviços. O maior
desafio é justamente fazer com que o mecânico de confiança da família passe a
ser o mecânico da concessionária.
* Stephan Keese é sócio
responsável para o segmento automotivo da Roland Berger Strategy Consultants
Fonte: Car and Driver Brasil
– edição 49
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