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*Por Alexandre Ribas
A expansão de carros elétricos em circulação é cada vez maior. Segundo o portal Statista, estima-se que em 2021 as vendas somaram 6,7 milhões de unidades em todo o mundo. Além disso, a Associação Brasileira de Veículos Elétricos (ABVE) aponta que, em julho deste ano, a frota brasileira atingiu a marca histórica de 100 mil veículos. No entanto, embora a solução para a descarbonização pareça lógica, nem tudo é o que parece. O uso de carros elétricos pode não ser tão sustentável e ainda enfrentar barreiras econômicas.
Apesar da China, que lidera o setor, investir em fontes mais limpas de energia — o que a coloca, por exemplo, entre as maiores produtoras de energia eólica, com 28,3% da capacidade instalada do mundo, segundo o Global Wind Energy Council (CWEC) —, a dependência da queima do carvão para gerar energia elétrica por lá é grande. Da mesma forma, o Brasil depende de usinas hidrelétricas, mas isso leva sua matriz a ser mais verde.
Veículos elétricos têm uma série de vantagens, como maiores eficiências, performance e aceleração. Mas hoje, em essência, refletem a matriz energética do país. A China, que liderou as paradas globais de vendas em 2021, com mais unidades do que o resto do mundo somado e quase cinco vezes mais que a Alemanha, que ficou em segundo lugar, ainda queima carvão para gerar eletricidade, obtenção que ainda é muito mais barata.
Para serem uma solução viável, carros elétricos têm que depender de uma matriz que proveem energia verde e mais econômica. Portanto, esse é o caminho. Hoje, não se pode estimular a frota eletrificada se não for incentivada em paralelo a produção de energia limpa. Energia precisa ter custo baixo. E quanto mais limpa, melhor. E abundante.
Ainda dentro da pauta de sustentabilidade, um estudo publicado pela fabricante sueca Volvo indicou que a produção de um veículo elétrico ainda provoca muito mais danos ao meio ambiente que a de um equivalente a combustão. A diferença chega a cerca de 60%. Segundo a pesquisa, enquanto a fabricação de um único XC40 T5 (a gasolina) emite 14 toneladas de CO² na atmosfera, a de um XC40 Recharge (versão 100% elétrica do SUV) atinge cerca de 24 toneladas, sendo sete delas geradas apenas na produção das baterias.
Nesse cenário, a diminuição da pegada de carbono vem com o uso: é preciso percorrer muitos quilômetros para equalizar e, a partir de então, diminuir o índice de emissão de gases estufa — o que pode levar anos. Pode-se dizer que a redução da pegada dentro da cadeia de produção é uma das principais missões a serem cumpridas pelas empresas.
É como se fosse uma desmistificação. É claro que, com a tecnologia mais avançada que a dos de combustão interna, eles podem ser bem menos poluidores, mas ainda existe um longo caminho a ser percorrido para uma redução líquida dessa pegada de carbono, avanços globais que precisam acontecer para que novas soluções de baterias e outras fontes de eletricidade mais limpas do que as atuais possam ser desenvolvidas.
Descarte de baterias pode ser problema a longo prazo
Uma vez esse obstáculo colocado em perspectiva, há outro desafio: o destino de baterias a longo prazo. É preciso criar modelos de processo para uso e reciclagem do material. E como preparar a sociedade para isso? Hoje, são raros os lares brasileiros que fazem a separação das pilhas usadas em casa, que não servem mais. Imagine o dano ambiental das baterias descartadas em locais irregulares sem o tratamento adequado e necessário.
Outra questão é econômica. O preço do lítio chegou a subir 250% em 2021, de acordo com a Benchmark Mineral Intelligence, o que impacta o valor final. Hoje, para adquirir um veículo elétrico, o consumidor brasileiro desembolsa até o dobro do mesmo modelo à combustão. E assim faço outro questionamento: há quantidade suficiente de reservas minerais desse elemento para atender a uma substituição total da frota automotiva?
Como resposta, eu cito o uso do hidrogênio como caminho a ser explorado. Nós vivemos um momento de transição, saindo dos motores de combustão interna e indo para os elétricos, e tecnologias tendem a coexistir. Não se sabe qual será a dominante. Células de hidrogênio requerem menos adaptações nas indústrias e aparentam ser mais limpas. Hoje, grandes montadoras já trabalham as duas opções, da mesma forma que há espaço e escala para que existam juntos. Nenhuma tecnologia pode ser descartada.
Em meio à fase de ressignificação pela qual passa a cadeia de produção, empresas e consumidores devem estar atentos para a durabilidade dos veículos movidos por energia armazenada em baterias e perda do valor após a aquisição. Estimativas da tabela FIPE demonstram que esses veículos perderam em média 41% do valor após três anos de uso.
Infraestrutura deve surgir conforme demanda
Segundo o Statista, o número de carregadores de veículos elétricos rápidos disponíveis publicamente em todo o mundo cresceu 109% entre 2019 e 2021 — das quase 564 mil unidades, 83% foram encontrados na China. A partir desses números, não é surpresa afirmar que a infraestrutura de reabastecimento vai surgir conforme nascer a demanda.
A condição para instalar um posto de recarga rápida é infinitamente mais simples do que a de um posto de gasolina, que exige cavar, enterrar o tanque de combustíveis, selar o solo e buscar uma série de licenças ambientais. Basta uma rede de média tensão. O interesse econômico vai surgir, portanto, quando começar a ter demanda para isso.
Não se pode negar que a eletrificação é uma realidade, por ser um degrau evolutivo na tecnologia da indústria automobilística, e que o caminho para zerar as emissões não será necessariamente linear, já que cada região pode evoluir ao longo do tempo transitando por diferentes inovações. Mesmo com os desafios apresentados pelo setor, o interesse das empresas, principalmente aquelas que tem a temática ESG como prioridade, e dos consumidores só aumenta. É preciso superar as barreiras para ser cada vez mais verde.
Para ABVE, eletromobilidade é a grande fronteira tecnológica do século XXI
A ABVE e o Instituto de Engenharia assinaram, em agosto, a Carta da Eletromobilidade, em que defendem uma política nacional de transporte sustentável no Brasil e colocam o país como um dos poucos no mundo que podem ter mais de uma tecnologia para enfrentar a questão das emissões e mobilidade sustentável, onde a eletrificação, junto com os biocombustíveis, terá papel relevante. No texto, assinado pelos presidentes, a eletromobilidade é vista como a grande fronteira tecnológica da indústria do século XXI.
Ao redor do mundo, outras nações incentivam os carros elétricos e os colocam como a única solução possível para o problema da emissão de gases poluentes. Nos Estados Unidos, por exemplo, o governo de Joe Biden estabeleceu como meta ter 100% da sua frota eletrificada até 2030. Já em Portugal, o governo federal ofereceu incentivo de 4 mil euros para aqueles que tivessem interesse em comprar um carro elétrico novo no país.
Outro bom exemplo de adaptação vem da Alemanha, onde um a cada três carros novos são elétricos. Já na China, os veículos elétricos são vistos como o futuro: estima-se que entre 25 e 50% do mercado de veículos de passageiros até 2025 seja de carros movidos por tração elétrica. No entanto, é a Noruega que tem a maior participação de veículos elétricos em sua frota: esses automóveis representaram a maioria dos novos registros em 2020. A explicação está nos fortes incentivos apresentados pelo governo norueguês.
Outro levantamento do Statista aponta que, entre 2021 e 2027, o tamanho do mercado global de veículos elétricos deve aumentar mais de quatro vezes e atingir cerca de 1,4 trilhão de dólares. Enquanto países como China e Alemanha conseguem aumentar sua frota de carros elétricos, nações como o Brasil, que já utilizam uma energia mais limpa, passam por dificuldades por falta de incentivos do governo, o que acarreta altos custos.
*Alexandre Ribas é sócio da Falconi desde 2014 e diretor da Unidade de Indústria de Bens Duráveis, segmento que engloba os setores de veículos e autopeças, da consultoria.
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