terça-feira, 14 de agosto de 2018

Grandes mudanças no setor da mobilidade nas próximas décadas



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Por * Heitor Bucker

Há grandes mudanças ocorrendo em diferentes setores da indústria na atualidade, bem como muitas mais previstas para as próximas décadas. Com as alterações nos cenários tecnológico, produtivo e mercadológico tornando-se cada vez mais aparentes, empresas atuantes no setor automotivo buscam ficar à frente da curva, concorrendo e estabelecendo sinergia com empresas de outros segmentos, áreas de tecnologia e modelos de negócio. Paradigmas vistos como transformadores neste novo cenário, como a Inteligência Artificial, a eletrificação de veículos, a tecnologia sem motorista, o compartilhamento de carros, o “carro definido por software”, e o “carro conectado”, integram o foco das áreas de desenvolvimento das empresas do setor.

A evolução das tecnologias em sensoriamento, acopladas à evolução de redes 5G e de longa distância com baixa energia, da internet das coisas e dos sistemas de mapeamento e geolocalização transformam a perspectiva dos veículos e de seus componentes - que passam de elementos individuais para sistemas ciber-físicos integrados aos ambientes digital e físico.

Carros se comunicarão não apenas uns com os outros, mas também com infraestruturas em ambientes diversos

Os fabricantes de automóveis estão atualmente reformulando a arquitetura eletrônica e de rede dos veículos para garantir que cada subsistema seja conectado e definido por software. Em direção à próxima década, a indústria automotiva alcançará a mobilidade cooperativa: os carros se comunicarão não apenas uns com os outros, mas também com infraestruturas em ambientes diversos. A eletrificação mudará a maneira como os consumidores alimentam seus veículos. O compartilhamento de carros e os veículos sem motorista provavelmente levarão à consolidação de uma condição totalmente diversa de mercado, com maior integração e uso dos diferentes modais de transporte. Veículos simples, como as bicicletas, já adotadas de forma intensiva em cidades da Europa e Ásia, estarão presentes ao lado de veículos aéreos, como os VTOLs (Vertical Take-off and Landing), hoje em fase de desenvolvimento por empresas como a Uber e Embraer. Grupos universitários (1), no Brasil e em outros países, desenvolvem drones auto dirigíveis com uso de Inteligência Artificial.

Tecnologias como interfaces homem-máquina e eletrônica de corpo, aprimoram a condição física e mental de um motorista, incluindo evitar a direção em condições de sonolência e desatenção, bem como fazem uso de sistemas com uma ampla gama de dados para transmitir ao motorista informações selecionadas.

A transmissão de dados e a transferência de informação passam a ser não apenas uma via de mão dupla a partir do veículo, mas múltipla, com dados trafegando de diferentes componentes para sistemas diversos, o que leva a cenários disruptivos em diferentes frentes.

Em 2016, em uma das sessões do Painel Internacional do Congresso SAE BRASIL (2), foram apresentados como componentes da suspensão de veículos podem vir a monitorar condições das vias públicas. Em 2017, no painel de TI (2) deste congresso, enxergamos o mapeamento com geolocalização de cidades, ao nível de detalhe de letreiros em estabelecimentos.

Um número crescente de novas funções, fornecedores e tarefas a serem orquestradas pelas áreas de desenvolvimento

A crescente conectividade dos veículos resulta em um número crescente de novas funções, fornecedores e tarefas a serem orquestradas pelas áreas de desenvolvimento. Passa a ser necessária uma visão sistêmica, pois a esfera de influência não está mais limitada apenas aos veículos - recursos e funções externas também afetam as áreas altamente sensíveis de segurança e confiabilidade. O foco em Cyber Security está cada vez mais presente.

Para dominar as inúmeras interações resultantes dentro e fora do veículo, passa a ser essencial considerar todo o ecossistema em cada etapa do desenvolvimento. Requer uma visão sistêmica que abranja das áreas de desenvolvimento do produto às áreas de negócio, como também as de infraestrutura dentro e fora do país.

Novos modelos de negócio e serviços passam a integrar diferentes áreas do transporte de passageiros e de cargas. A possibilidade de rastrear e processar através de sistemas de Inteligência Artificial os muitos milhões de viagens nos sistemas de transporte - seja em sistemas de metrô, ônibus urbanos, viagens rodoviárias ou ciclovias, ou, ainda, combinações destes - permite aos planejadores gerenciar a carga da rede, minimizar a interrupção da manutenção e construir sua rede de acordo com a demanda.

Sistemas integrados de logística passam a otimizar o deslocamento de cargas através de cidades e do país. A economia compartilhada passa a estar cada vez mais presente, haja visto as bicicletas Yellow, sem estação. A relação de posse do veículo deixa de ser relevante. As empresas de táxi estão se modernizando, reagindo à pressão crescente da forte concorrência da Uber e de outros serviços de compartilhamento de carros. Concessionários e postos de gasolina estão repensando sua estratégia de mercado incluindo a oferta de novos serviços. Fornecedores de seguros também enfrentam cenários disruptivos através do grande potencial de dados a seu dispor.

A integração entre consumidores e processos produtivos, até o descarte e o reaproveitamento
Compõem os cenários atuais e futuros a integração e aproximação entre consumidores, concepção e desenvolvimento de produtos e serviços, infraestrutura, a cadeia de abastecimento e produtiva, o descarte e o seu reaproveitamento. Conectar os pontos dentro da fábrica e dentro do ecossistema da empresa, assim como o uso inteligente da informação, será cada vez mais um requisito para se manter competitivo.

Conforme mencionado no “KPMG Global Customer Experience Excellence report: Tomorrow experience today” (4), novas tecnologias estão transformando cada aspecto da experiência do cliente. Empresas líderes já estão buscando vantagem competitiva através de implementação de forma seletiva. Ver infográfico da figura 1.

O Brasil está chegando, mas ainda de forma incipiente, na implementação da manufatura avançada ou Indústria 4.0. Dados da Federação Internacional de Robótica indicam a comercialização de 1,5 mil robôs no país, uma participação de 0,005% dentro de um universo global de 294 mil unidades, em 2016. Segundo pesquisa publicada pela FIESP e SENAI, no primeiro semestre de 2018, apenas 68% da amostra composta por 227 empresas de diferentes setores e tamanhos, tem conhecimento do conceito Indústria 4.0, e apenas 30% desses 68% já iniciaram algum investimento nesta direção. Na Alemanha, segundo a PWC (3), cerca de 90% das empresas declaram estar investindo na transformação digital, em fábricas digitais e na Indústria 4.0. Hoje máquinas e outros ativos são alvo de integração através de sistemas de execução de manufatura (MES) e integrados às infraestruturas de ERP, de forma a conectarem não apenas os processos internos, mas também toda a cadeia de suprimentos. Tecnologias como cobots e sistemas de visão impulsionam a qualidade, flexibilidade e produtividade das operações. Empresas tomam decisões mais inteligentes, embasando-se em análises de dados, algoritmos de predição e otimização, dentre outras técnicas de aprendizado de máquina. As soluções de realidade aumentada ajudam as áreas de treinamento e manutenção, e permitem aos funcionários gerar produtos com zero defeito.

As montadoras e empresas de maior porte instaladas no país lideram iniciativas em direção à manufatura avançada. A fábrica da FCA no polo automotivo de Goiana, no estado de Pernambuco, detém a linha de produção do JEEP, que utiliza tecnologias inovadoras, com 700 robôs e maquinário de alta precisão. A unidade fabril da Jaguar Land Rover instalada no Brasil é a primeira da empresa integrada segundo conceitos da Indústria 4.0 e é vista como referência para as demais unidades fabris da corporação. Em março deste ano, a Mercedes-Benz finalizou a implantação de sua Linha 4.0 para produção de caminhões. Caminhões de diferentes modelos e portes são hoje produzidos nesta linha com flexibilidade e 15% mais rápidos. Uma perspectiva da dinâmica envolvida nesta linha será enfoque dos painéis de Transformação Digital e Operações Industriais Conectadas (2) do Congresso SAE BRASIL 2018. A Sabó, uma empresa multinacional brasileira no ramo de autopeças, vem avançando na implantação de sua estrutura fabril 4.0, integrando tecnologias de startups, fornecedores parceiros e desenvolvimento interno.

Muitos líderes empresariais ainda não chegaram a uma conclusão sobre as oportunidades e desafios relacionados à transformação digital

O desafio para muitas empresas não está necessariamente em deter o “expertise” das diferentes tecnologias, mas está em estabelecer a perspectiva e uma estratégia gradual para o uso eficiente deslas em prol do negócio e do cliente. Muitos líderes empresariais ainda não chegaram a uma conclusão sobre as oportunidades e desafios relacionados à transformação digital ou ao entendimento do salto conceitual que isso representa. Cabe trocar ideias e refletir sobre os próximos passos dentro desse contexto. Sob este aspecto é interessante a aproximação com organizações como a SAE BRASIL, que congrega profissionais, especialistas e líderes do setor da mobilidade e oferece através de ações diversas, como o seu congresso (2), uma janela de oportunidade de relacionamento com diferentes frentes de tecnologia. Em relação ao Congresso, que será de 3 a 5 de setembro, em São Paulo, destacam-se os painéis Internacional (2a), de Operações Industriais Conectadas (2b) e de Transformação Digital (2c). As sessões do painel Internacional focam dois temas principais – “How the automotive industry is appropriating the future now” e “How the mobility market is evolving for tomorrow –Beyond the Megatrends”. O painel de Operações Industriais Conectadas explora a integração da cadeia logística interna e externa, trazendo ao palco as novidades da linha 4.0 de uma montadora ao lado das contribuições e crescimento de uma startup em logística. No painel de Transformação Digital, haverá uma exibição (showcase) das novas tecnologias disponíveis, seguida por uma mesa redonda para discussão da transformação digital na mobilidade, da qual participam CIOs e VPs de Pesquisa e Desenvolvimento.

Ainda no âmbito da transformação digital e manufatura avançada, faz-se oportuno uma conexão com grupos como o GTMAV (5) da ABIMAQ e VDI (6). Na academia, vale acompanhar iniciativas como as da Engenharia Mauá, Escola Politécnica, ITA, FEI, o LAR da UFSC (7) e o LRM da USP São Carlos (8). Uma conexão com centros de desenvolvimento, como o Instituto Eldorado (9), o CPqD (10), FIT (11), SENAI CIMATEC (12) e outros institutos associados ao IPD Eletron (13) oferecem alternativas de desenvolvimento. Dentre as aceleradoras de startups destacam-se, dentre várias, o CUBO (14) e a Oxigênio (15). A implantação de novas tecnologias requer também evitar modernizar o desperdício. Neste quesito cabe inteirar-se com iniciativas do Lean Institute Brasil (16), Staufen.Taktica (17) e outras consultorias em manufatura enxuta.

O cenário é dinâmico, repleto de desafios e oportunidades – é preciso olhar o horizonte através de lentes com foco orientado para o futuro.

* Heitor Bucker é sócio diretor da consultoria How Who Reach, focada em projetos de estratégia em acesso ao mercado. Participa da SAE BRASIL como Co-Chairperson do Comitê Internacional do Congresso SAE BRASIL.

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