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Por Michel Levy (*)
Um
carro elétrico para três passageiros do tamanho de um SUV grande que pode ser dirigido
nas ruas e voar de forma autônoma por cima dos congestionamentos. Isso mesmo.
Um carro voador. Há 1 mês a startup NFT
apresentou o protótipo do Aska e
divulgou planos de iniciar testes de voo já no primeiro trimestre de 2020 e a
comercialização a partir de 2025. Para voar, o usuário poderá dirigir o carro
até uma área aberta, abrir as asas e decolar verticalmente para uma viagem de
até 150 milhas sem piloto, sob o comando da Inteligência Artificial. O carro
irá aterrissar em outra área aberta e o motorista assume novamente o volante
até o destino final.
A
Deloitte
estima que o mercado americano para aviões elétricos para decolagem e
aterrisagem vertical (EVTOL) será de US$ 6,8 bilhões em 2035 e poderá chegar a
US$ 17,7 bilhões em 2040 com a queda dos custos da tecnologia e uma maior
aceitação dos usuários.
Uber, Airbus e Boeing se apressam para garantir espaço no mercado de
veículos voadores para táxi aéreo nas cidades, mas construir um carro
voador confiável não vem sendo uma tarefa fácil e há ainda a necessidade
de regulamentações que não comprometam a segurança do trafego aéreo. Um
acidente ocasionado pela pressa de lançar o produto pode colocar em risco o
sucesso dessa indústria. Mas, assim como já está acontecendo com os drones, em
um futuro não muito distante deveremos ver carros voando por aí.
Tem
coragem?
Se
considerarmos a rápida adesão dos usuários a novos meios de transporte é
provável que muita gente embarcaria no carro voador da NFT. Especialmente numa
cidade como São Paulo onde a circulação de helicópteros faz parte da rotina. Com
a saturação da frota de automóveis particulares que contribuem para poluição e
geram altos custos públicos com acidentes nas grandes cidades, é crescente o
desejo por veículos alternativos mais rápidos, econômicos e sustentáveis.
Como
consequência, estamos assistindo a um ‘boom’ em grandes cidades mundo afora de novos
serviços de micromobilidade, um mercado que deverá movimentar entre US$ 200
bilhões e US$ 300 bilhões até 2030, de acordo com a CB Insights.
Segundo a Frost & Sullivan, até 2020 devem surgir 150 novos veículos. O novo mercado já está
atraindo o interesse até mesmo das grandes montadoras. No final do ano passado,
a Ford divulgou a compra por US$ 100 milhões da Spin,
empresa de aluguel de patinetes elétricos fundada em San Francisco há dois
anos.
A
micromobilidade é definida como pequenos modos de transporte com peso inferior
a 500Kg, propulsionados por humanos ou motores elétricos, com velocidade abaixo
de 50 km/hora e que servem as chamadas “primeira e última milha”, realizando a interconexão
com o transporte público de massa. O termo foi pronunciado pela primeira vez
por Horace Dediu, em setembro de 2017, no Tech Festival, realizado em
Copenhagen.
O
mercado em São Paulo, por exemplo, é muito promissor, já que 53% dos 40 milhões
de deslocamentos na cidade podem ser realizados com patinetes e bicicletas,
segundo o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap). Já um estudo realizado pela consultoria
norte-americana McKinsey
revela que 60% dos deslocamentos em todo o mundo são realizados em distâncias
menores do que oito quilômetros.
Em
São Paulo, 80% do espaço das ruas é destinado aos automóveis, o que acaba por
gerar conflitos entre ciclistas e motoristas. O estudo do Cebrap avaliou
possíveis impactos positivos da bicicleta no lugar de carros e ônibus. Seria
possível uma redução de R$ 34 milhões nas despesas do Sistema Único de Saúde
(SUS) com internações causadas por diabetes ou doenças cardiovasculares. O relatório
também estimou quanto a economia da cidade de São Paulo ganharia com esta opção
mais rápida: nada menos que R$ 870 milhões.
Mas
o rápido avanço da indústria mundial de veículos de micromobilidade fez acender
o sinal amarelo para os riscos que possam trazer e já estão trazendo para
segurança dos usuários. Toda inovação em áreas sensíveis como transporte urbano
demanda o estabelecimento de regras que ajudem a prevenir acidentes fatais. A
pedido do Procon de São Paulo, o Corpo de Bombeiros do Estado divulgou o número
de feridos em acidentes com patinetes na capital paulista entre janeiro e abril
deste ano: foram 274 ocorrências.
Empresas
como Tembici, Yellow, Grin, Serttel, Bird, FlipOn, Lime e Trunfo são algumas
das representantes deste novo mercado que, de uma hora para outra, seguindo
tendência que começou na Califórnia e se espalhou por outros grandes centros
dos Estados Unidos e pela Europa, colocaram centenas, milhares de patinetes e
bicicletas elétricas nas ruas das grandes capitais do País, o que levou o a
Prefeitura de São Paulo a impor restrições depois dos registros dos primeiros
acidentes.
A
Política Nacional de Mobilidade Urbana, que foi publicada em 2012, não
considera a categoria de micromobilidade. O Decreto 58.750,
de 13 de maio de 2019, trouxe regras provisórias, como a velocidade máxima
limitada em 20 km/h, proibição de circulação em calçadas e em vias onde os
limites de velocidade sejam superiores a 40 km/h.
Ficou
estabelecido que as locadoras teriam de se credenciar junto à Administração e
cuidar da segurança dos equipamentos e dos condutores, obrigando-os a usar
capacetes (exigência depois extinta pela
Justiça) e trafegar somente em vias, ciclovias e ciclofaixas. Nas calçadas, a
circulação foi terminantemente proibida. As multas fixadas podem chegar a R$ 20
mil e são aplicadas às operadoras, que podem repassar aos usuários.
Na
Europa aconteceu um acidente fatal envolvendo um patinete elétrico na
Catalunha, aumentando a tensão e levando
ao banimento total do serviço de aluguel de patinetes em Barcelona. Em Los Angeles, nove pessoas se machucaram com
patinetes elétricos e entraram com uma
ação coletiva em outubro no Tribunal Superior do Condado. O processo acusa as
startups Bird Rides e Lime, assim como as fabricantes Xiaomi e Segway, de
negligência grave, alegando que as companhias sabiam que as patinetes eram
perigosos e os implantaram de uma maneira que certamente causaria ferimentos.
Já
a Ministra dos Transportes da França, Elisabeth Borne, anunciou recentemente a proibição dos patinetes elétricos nas calçadas de
Paris. A lei, que entra em vigor a
partir de setembro, prevê aplicação de multa de 135 euros para quem não
respeitar o novo regulamento. Diversas regras passarão a regular a circulação
dos chamados "dispositivos motorizados de movimentação pessoal"
(EDPM, sigla em francês), como patinetes e monociclos elétricos, segways ou
hoverboards. O limite de velocidade será de 25 km/h e 2500 vagas de
estacionamento devem ser criadas até o final do ano. Atualmente, um total de
dez empresas estão operando na capital francesa.
Outro desafio é o vandalismo. No Reino Unido, a Mobike
informou que 10% de sua frota foi destruída ou roubada em 2018. E a GoBee deixou
o mercado europeu depois que 60% da sua frota ficou destruída e danificada
apenas quatro meses após o lançamento.
O
mau uso dos equipamentos é uma preocupação das empresas e dos governantes. Segundo
o New York Times,
as mais de 16 milhões de bicicletas compartilhadas criadas na China por mais de
70 empresas inundaram cidades como a já lotada Beijing ou em Xangai, onde há
uma bicicleta para cada 16 habitantes. Elas acabam abandonadas em calçadas e
ruas, comprometendo o trânsito já caótico das grandes cidades chinesas, penduradas
em árvores, enterradas em campos de construção ou arremessadas em rios.
Sabemos
que no Brasil também há grandes desafios para garantir a segurança da
micromobilidade. São raras as vias que têm pavimentação adequada para o
trânsito de um patinete, e as vias principais, geralmente com melhor
pavimentação, são muito rápidas para este tipo de veículo.
A
discussão das regras é fundamental para que a inovação traga as soluções que
precisamos para uma convivência mais pacífica entre quem opta por carro,
bicicleta, patinete, ônibus ou, em pouco tempo, táxis voadores.
O
que não pode acontecer é o arcabouço legal e a burocracia frearem o avanço de
novas soluções. Regular é muito importante, mas na medida certa e com bom
senso. Toda transformação impõe a quebra de velhos paradigmas.
Ou
você embarcaria de olhos fechados em um voo sem piloto e sem torre de controle?
(*)
Michel Levy é do conselho de Administração da Omnilink, empresa que oferece
integração de soluções para segurança e prevenção de risco, gestão de frotas,
monitoramento de veículos e telemetria.
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